A orelha que escrevi para o livro de poemas de Oleg Almeida, “Desenhos a lápis”, recém-saído da gráfica. Oleg Almeida é escritor premiado e tradutor, especialmente dos clássicos russos e franceses. Vive em Brasília. O livro trata das impressões que colheu sobre a cidade de São Paulo, durante o período em que morou aqui.
Cidade cinza, cidade santa
O artista desenha a lápis para traçar um esboço. Pretende que seja rascunho. Com o tempo e a vivência, o desenho pode ser apagado e refeito, ou reforçado e arte-finalizado. Como esboço ainda, é registro da impressão, não da convicção. O olhar do artista que testemunha cenas, pessoas, situações, neste livro, pertence ao poeta que observa de fora, estrangeiro quase, e é tomado de estranhamento por aquilo que toda a gente vê, ao passar, e não enxerga. Ou não quer enxergar, gente anódina, álgica, autômata. Que assim é, se fez ou foi feita. Nesta coletânea de poemas breves, temos um mapa. Aleatório. Mosaicista. Os olhos verdes do mendigo – hosana, há mendigos de olhos verdes! O medo mais que mitológico da São Paulo que esmaga seus habitantes – de aço, concreto, obscuridade e medo; hipocrisias, couraças, egoísmos. Porém, há esperança, sinceridade e luz em quase tudo: grafites, multidões, praças, solidões, gírias, prisões, crenças. O poeta veio de fora, mas olha por dentro. E nos ajuda a enxergar a cidade que nem sequer vemos.